sábado, 24 de janeiro de 2009

SENTAR-SE À JANELA


Era criança quando,
pela primeira vez, entrei em um avião.
A ansiedade de voar era enorme.
Eu queria me sentar ao lado da janela de qualquer jeito,
acompanhar o vôo desde o primeiro momento
e sentir o avião correndo na pista cada vez mais rápido
até a decolagem.
Ao olhar pela janela via, sem palavras,
o avião rompendo as nuvens, chegando ao céu azul.
Tudo era novidade e fantasia.
Cresci, me formei, e comecei a trabalhar.
No meu trabalho, desde o início,
voar era uma necessidade constante.
As reuniões em outras cidades
e a correria me obrigavam,
às vezes, a estar em dois lugares num mesmo dia.
No início pedia sempre poltronas ao lado da janela, e,
ainda com olhos de menino, fitava as nuvens,
curtia a viagem, e nem me incomodava
de esperar um pouco mais
para sair do avião, pegar a bagagem, coisa e tal.
O tempo foi passando, a correria aumentando,
e já não fazia questão de me sentar à janela,
nem mesmo de ver as nuvens, o sol, as cidades abaixo,
o mar ou qualquer paisagem que fosse.
Perdi o encanto.
Pensava somente em chegar e sair,
me acomodar rápido e sair rápido.
As poltronas do corredor agora eram exigência .
Mais fáceis para sair sem ter que esperar ninguém,
sempre e sempre preocupado com a hora,
com o compromisso,
com tudo, menos com a viagem,
com a paisagem,
comigo mesmo.
Por um desses maravilhosos 'acasos' do destino,
estava eu louco para voltar de São Paulo
numa tarde chuvosa,
precisando chegar em Curitiba
o mais rápido possível.
O vôo estava lotado e o único lugar disponível
era uma janela,
na última poltrona.
Sem pensar concordei de imediato,
peguei meu bilhete e fui para o embarque.
Embarquei no avião, me acomodei na poltrona indicada:
a janela.
Janela que há muito eu não via, ou melhor,
pela qual já não me preocupava em olhar.
E, num rompante, assim que o avião decolou,
lembrei-me da primeira vez que voara.
Senti novamente e estranhamente aquela ansiedade,
aquele frio na barriga.
Olhava o avião rompendo as nuvens escuras até que,
tendo passado pela chuva, apareceu o céu.
Era de um azul tão lindo como jamais tinha visto.
E também o sol, que brilhava como se tivesse acabado de nascer.
Naquele instante, em que voltei a ser criança,
percebi que estava deixando de viver um pouco a cada viagem
em que desprezava aquela vista.
Pensei comigo mesmo:
será que em relação às outras coisas da minha vida
eu também
não havia deixado de me sentar à janela,
como, por exemplo,
olhar pela janela das minhas amizades,
do meu casamento,
do meu trabalho e convívio pessoal?
Creio que aos poucos, e mesmo sem perceber,
deixamos de olhar pela janela da nossa vida.
A vida também é uma viagem
e se não nos sentarmos à janela,
perdemos o que há de melhor:
as paisagens, que são nossos amores,
alegrias, tristezas, enfim,
tudo o que nos mantém vivos.
Se viajarmos somente na poltrona do corredor,
com pressa de chegar, sabe-se lá aonde,
perderemos a oportunidade de apreciar as belezas
que a viagem nos oferece.
Se você também está num ritmo acelerado,
pedindo sempre poltronas do corredor,
para embarcar e desembarcar rápido e 'ganhar tempo',
pare um pouco e reflita sobre aonde você quer chegar.
A aeronave da nossa existência voa célere
e a duração da viagem não é anunciada pelo comandante.
Não sabemos quanto tempo ainda nos resta.
Por essa razão, vale a pena sentar próximo da janela
para não perder nenhum detalhe.
Afinal, 'a vida,
a felicidade e a paz são caminhos
e não destinos'.
Alexandre Garcia

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