domingo, 24 de agosto de 2008

O Homem e a Alma



E o Deus dos deuses separou de si mesmo uma alma
e a dotou de beleza.

E deu-lhe a suavidade da brisa matinal e o perfume das
flores do campo e a doçura do luar.

E entregou-lhe a taça da alegria, dizendo-lhe:
"Só poderás beber desta taça se esqueceres o passado
e não te preocupares com o futuro."
E entregou-lhe a taça da tristeza, dizendo:
"Bebe dela, e compreenderás a essência da alegria da vida."

E soprou nela um amor que a abandonaria ao primeiro
suspiro de saciedade, e uma meiguice que a
abandonaria à primeira manifestação de orgulho.

E fez descer sobre ela, do céu,

um instinto que lhe revelaria os caminhos da verdade.

E depositou nas suas profundezas uma visão
que vê, o que não se vê.

E criou nela sentimentos que deslizam com as
sombras e caminham com os fantasmas.

E vestiu-a de um vestido de paixão que os anjos teceram
com as ondulações do arco-íris.

E colocou nela as trevas da dúvida, que são as
sombras da luz.

E tomou fogo da forja do ódio,

e ventos do deserto da ignorância,

e areia do mar do egoísmo,

e terra pisada pelos pés dos séculos

e amassou todos esses elementos e fez o homem.

E deu-lhe uma força cega que se inflama nas horas de
loucura e desvanece diante das tentações.

Depois, depositou nele a vida, que é o reflexo da morte.

E sorriu o Deus dos deuses,
e chorou,

e sentiu um amor incomensurável e infinito
e uniu o homem e a alma.

(Gibran Khalil Gibran)

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